domingo, 23 de outubro de 2011

JOSÉ CARLOS PATRÃO - POESIAS

                     


POETA DE PORCELANA...



Meio silêncio basta
Meio sorriso
dispensa a gargalhada
que soa a troça…

Nostálgicos são os sinais
que percorrem a cidade obscura...
A luz da lua é alquimia
e o aroma de flores
soa a perfume insensato…

Contudo aqui não deve ser o Inferno...
Está demasiado frio
e a minha pele não derrete…
Mesmo debaixo de água
não me afogo
e a fantasia
nunca mais será a mesma…

Até ao presente
a manhã foi-me devota…
Aparece mesmo em dias de guerra...
Fui-lhe infiel e gritei...
Disse-lhe ADEUS
antes que fosse tarde...
Poderia tropeçar e quebrar-me…
Pois sou apenas
um poeta mudo...
...de porcelana…

Sonhava em espreitar a estupidez
sem que ela me detectasse...
Talvez um conceito meu
de altivez...
Uma viagem mental
a um destino que nunca chegasse...

Sonhava também
em abandonar a cobardia
e ter a coragem de afirmar
que esta noite se está a tornar irritante
e estou farto de escrever...

Manias de descrever
estranhos mundos
que não são meus...
Caminhadas à chuva
em belos dias de praia,
em que os céus rivalizam
com tulipas azuis
e sedas rubi...
Voando o mais rápido que podem
tentando que o Tempo
se torne reversível...

Mesmo à espera
da paragem final
não me imiscuo de alegrar
um par de olhos tristes...
Sempre duvidando da claridade...
Com um sorriso disfarçado...
Pesando o delicado balanço
da ironia da tua verdade...




BALLERINA


Sinal de um tempo
Bailarina que flutua
numa dança que me entontece
voando…
Tropeçando com elegância
como um anjo ferido
em mentiras
e obstáculos perenes…
Chorando com alegria
pingos de chuva
frios
de Novembro…
Quisera esquecer-se
de caminhos percorridos
em exaustão e contumácia
de outrora, banidos…
Bailarina de betão
que adormece transeuntes
e seus reflexos
em gastos edifícios
envidraçados…
Respira em silêncio
com a memória congelada
e derretida…
Pontapeia folhas alaranjadas
do fim de um dia…
Sorri da estrada fantasma
iluminada
pelos seus lábios
que beijam o destino cromático
em que loucamente
acredita…
Esbarrei no seu olhar…
Dancei sem me mover…
Silhueta esbelta
de uma menina
que rodopia…
A que sem vertigens
sussurrei ao ouvido e
pausadamente
apelidei de…
…Ballerina…




REFÚGIO NO DESERTO


Como é que seria suposto
Ser o mundo
Para além desta cerca
Um refúgio
um espelho de mim
Qualquer coisa
Um momento
Que quebre o silêncio
Nem que seja a estupidez…
Estampada no rosto
Duma flor da manhã…
Que contudo me alegra…
Sinto-me vivo…
…casualmente…
Escolho-te para inspiração
Para além daquela pequena gota
Que desgastada me perseguiu
Ainda me lembro
Por vezes
De deixar a janela aberta
Na esperança de a voltar a sentir
Na face caída do Céu…
Rolando calidamente
Nas areias inocentes
Dum deserto só meu…



Sete de Espadas...



Desígnio dum mandamento
o número sem sorte
projectado numa carta de espadas
terá sido mal jogado
na retrospectiva
de um estranho lugar
algures
abaixo do soalho
do meu sótão…
Fez esvoaçar um pássaro em decadência
trespassando uma janela de folhagem
sem vista…
Sobressaltou
uma ninfa
outrora desenhada apenas por vocábulos…
Com seus olhos negros
obrigou-me a ajoelhar
oferecendo-me uma rosa vampiro
que faz borbulhar o sangue
num toque veludo
rodeado de espinhos…
Pareceu-me vislumbrar
reflexos de duas faces
atrás de máscaras
de beleza veneziana
exibindo frutos
e pestanas prateadas
muito para além da luxúria…
Confessei erros
acendi sorrisos
arranquei tudo que era verde
das folhas que manipulei
com as chuvas do meu suor…
Apesar de faltar sempre algo
sonhei com a imortalidade
de momentos sem nome
da mulher do vento…

* JOSÉ CARLOS PATRÃO - BIOGRAFIA



  


4 comentários:

  1. Olá JC
    Como sempre as palavras não são supresa para mim...a tua criatividade já n me espanta, mas sempre acabo presa nas novas metáforas, nos novos matizes. Continua, a poesia agradece.bjinho grande e fico à espera dessa colectânea pra deliciar os olhos e encher o espírito.
    São Reis

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  2. Belíssimos poemas. Foi com muita emoção que interpretei cada resposta . A palavra formada pelo poeta impregna a alma.

    Parabéns!

    Forte abraço!

    Mirze

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  3. Em cada poema J.C.Patrão deixa suas afirmações e sensibilidade. Vídeos, poemas e entrevista formam em uníssono a imagem do poeta que com certeza terá um futuro brilhante;

    Agradeço à você, Ianê, por compartilhar com tanta sensibilidade a poesia e a alma do poeta!

    Beijos aos dois

    Mirze

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  4. Que show de talento e beleza JC...adorei!!! Faz tanto tempo que esperava poder ter acesso aos seus trabalhos TODOS de alguma forma, fosse atraves de um Blog, ou de uma coletanea, enfim...parabens pelo projeto, adorei a entrevista, tentei postar meus comentarios sobre a mesma mas nao sei se saiu direito a postagem...so sei que estou FELIZZZZZZZZ!!! Beijinhos e obrigada...e ja agora beijinhos para a Iane...SUCESSO!!!AMEI...Maria Cristina Carvalho

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